“Tempo-abstrato” traz história de amor vivida em um Brasil que sofre com a polarização política e o conservadorismo

Em uma obra que abre espaço para a discussão de temas sensíveis como os embates geracionais, radicalismo político, a abstração do tempo e sua imprevisibilidade, a escritora e jornalista Amanda Pickler lança um romance sáfico que escancara a “alta velocidade” onde os jovens vivem: “Tempo-abstrato” (Se Liga Editorial) é intenso e revela como, para a geração de novos adultos, não há tempo nem espaço para o fracasso.

“Tempo-abstrato” nos apresenta a protagonista Victória Conti, uma jovem insatisfeita com seu emprego como repórter de uma revista de entretenimento, dona de baixa ambição, mas grande revolta com as pressões sociais da vida adulta. Ainda assim, Vic contenta-se em viver com a mediocridade de seu emprego, protegida pela segurança de sua família e de Isabel, sua melhor amiga. Até que o tempo resolve pregar-lhe uma peça. Maldição ou dádiva?

Ao acordar com uma dor de cabeça, Victória percebe que não está mais no ano ao qual pertence. Uma década havia se passado: o cabelo mudou, o rosto envelheceu, a carreira aflorou, nem mesmo sua sexualidade havia permanecido a mesma – agora, descobre também sentir atração por outras mulheres.  

Após cair de paraquedas nessa realidade completamente transformada, a protagonista se depara então com a missão de escrever um livro antes que tenha o contrato com a editora rompido – justo ela que sempre sonhou ser escritora –, ao passo que precisa consertar seu casamento desgastado com a pessoa mais inusitada possível. As viagens no tempo mexem com a cabeça de Vic, que passa a questionar sua própria sanidade, desenvolvendo sérias crises de ansiedade. Ao longo de sua trajetória, cruza caminho com pessoas surpreendentes, como uma carioca xereta e um gay evangélico, além do afastamento e reconexão com afetos importantes. Tudo isso enquanto Victória busca entender o verdadeiro sentido da vida nas idas e vindas entre passado e futuro – e a efemeridade do presente.     

O balanço entre ficção e as coincidências com eventos reais que o livro retrata faz da escrita de Amanda uma mistura ácida entre emoções afloradas e uma realidade que precisa ser questionada. Um livro fino, com uma história de amor como pano de fundo que traz a polarização e onda conservadora no cenário político brasileiro ao longo dos anos como ponto de reflexão.